o tempo não cresce
sobre mim há passagens avulsas
de divisões permanentes
e de repentes estancados
que molduram as horas
sobre os olhos abertos
no nada das vidas
que vai correndo
e suscita a relativa
do crescimento
do sangue do cabelo da unha
do medo
da chuva do sol da palavra
dos homens
a vida vai
saindo pelos becos
pelo sono pela noite pelo rio
pela mãe pelo filho
pela lágrima
pelo grito
das cigarras

e dizem a idade
do momento de viver
mas pode ferver sempre no mesmo de não ser
não querer
e alternar o subjetivo
do mesmo jeito que se deforma
o tempo todo
de vestígios

vou guardar as palavras
ditas no meio das noites -as promessas-
para me saber partida e pertencida como uma folha seca
de amendoeira que entra
pela janela e fica no chão da sala, entre as cadeiras vazias e o som da tv desesperada

para as lembranças bonitas
se mexerem no meu corpo
enquanto tu estiver tão longe
eu escreverei como tu me ensinou
eu anoitenço e desconstruo
o que era uma chuva de berros e fotos nuas
em qualquer poema sobre saudade

e das palavras que devastaram a ti e a mim de presenças
não sei o que fazer.

eu guardo a distância dos corpos estirada no fio da memória
quando as tuas mãos acendiam os incensos
e tudo isso se revirava em fardo e luz

vou guardar o teu rosto triste, poeta,
tua cara em máscaras
que faz a mulher mudar a fisionomia e ficar louca
como a barata de clarice em G.H

não guardo o que acaba no mistério estremecido
dos amantes amigos
nem o sempre dilatado
nessa janela que traz
só barulho urbano e vento
gelado.